Fernando Castilho
Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

Coitados dos velhinhos lesados pelo INSS. Só que não. Por Fernando Castilho

Mas sejamos claros: os aposentados vêm sendo lesados há anos. Desde o desgoverno Bolsonaro. A diferença é que agora a pauta virou útil.

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Coitados dos velhinhos lesados pelo INSS. Só que não. Por Fernando Castilho

A grande imprensa finalmente descobriu que os aposentados existem. E agora? O que eles comem? Como vivem? Poderiam ser tema do Globo Repórter.

Tanto a mídia hegemônica quanto os sites “progressistas”, que sempre trataram os aposentados com descaso ou silêncio, agora fingem interesse. Descobriram, enfim, que esse grupo — tachado de improdutivo, acusado de “mamar nas tetas do Estado” e sobrevivendo, em sua maioria, com um salário mínimo — está sendo roubado. Como se fosse novidade.

Mas sejamos claros: os aposentados vêm sendo lesados há anos. Desde o desgoverno Bolsonaro. A diferença é que agora a pauta virou útil. Serve como munição para induzir a população desinformada a culpar Lula, mesmo que o esquema envolva, na verdade, associações fraudulentas, servidores públicos corrompidos e bancos digitais famintos por lucro fácil.

Todo mundo sabia. A imprensa sabia. Os pais, avós e tios dos próprios jornalistas que agora posam de indignados talvez também tenham sido vítimas. Eu conheço vários. Eu fui um deles — ainda durante o governo anterior. Um banco digital depositou R$ 10 mil na minha conta do Banco do Brasil como empréstimo consignado que eu jamais solicitei. Devolver esse dinheiro foi um sufoco: o banco relutava em aceitar. E o que me disseram no balcão do BB? Que funcionários do INSS vendem dados dos aposentados para essas instituições.

Agora, de repente, nos chamam de “vulneráveis”. De “coitadinhos”. Não. Não somos coitadinhos. Somos cidadãos com direitos. E exigimos respeito.

Um desses direitos — a Revisão da Vida Toda — foi conquistado em 2022, por decisão do STF. Mas em 2025, essa vitória foi anulada por uma manobra sórdida da própria Corte, baseada em dados manipulados: disseram que o impacto da medida seria de R$ 480 bilhões. A verdade? R$ 3,1 bilhões em dez anos. Alguém viu manchete sobre isso? Editorial? Alguma indignação de colunista da “grande imprensa”? Nada. Silêncio ensurdecedor. Ignoraram solenemente a anulação de um direito legítimo.

Mas agora, quando o escândalo rende cliques e pode ser usado politicamente contra o atual governo, os aposentados viram notícia?

São 102 mil aposentados que tiveram suas contribuições anteriores a 1994 simplesmente apagadas, como se nunca tivessem existido. Gente que vive com um salário mínimo!

Foram enviados dezenas de e-mails e mensagens a deputados e senadores progressistas. Nenhuma resposta. Nenhuma! Para ser justo, apenas Luís Nassif (GGN) e Mauro Lopes (Fórum) ousaram tocar no tema — mas pararam por aí. Nenhuma matéria de impacto, nenhuma investigação. Um jornalista investigativo de um conhecido site de esquerda chegou a propor uma entrevista. Mas, curiosamente, recuou uma semana depois.

Enquanto isso, a Faria Lima pressiona o governo para não conceder aumento real ao salário mínimo. Cortar o pouco dos pobres pode. Mexer com os lucros dos que vivem de dividendos? Nem pensar.

Agora, uma matilha de hipócritas finge preocupação com os aposentados porque o esquema bilionário foi exposto. Um esquema que acontece há anos. Mas, claro… aposentado não serve para nada, não é? Só fica reclamando, como se tivesse direito a alguma coisa.

Pois bem. Que esta minha indignação alcance alguém com coragem e poder de ação. Que haja quem tenha disposição para esmiuçar esse escândalo, dar nome aos culpados e denunciar, alto e claro, mais essa injustiça.

Quem sabe.

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

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2 Comentários

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  1. Boa, doutor!

    Precisamos profanar o altar deste país de vestais e outros ilusionistas que ficam nas redações de blogs, jornais, emissoras de rádio e TV descendo o sarrafo em quem contraria suas ideologias e mais ainda de seus patrões. Não necessariamente nessa ordem.

    O retrato puro e acabado deste pobre país, onde um terço é de analfabetos funcionais e outro de analfabetos políticos, está em “Os Donos do Poder” do jurista e intelectual brasileiro Raimundo Faoro, publicado em 1958 pela Editora Globo, que completa 100 anos neste 2025. É obra que deveria ser a bíblia pelas informações antropológicas, sociológicas, filosóficas e de ciência política que traz.

    O cearense Capistrano de Abreu, um dos maiores historiadores brasileiros, defendia uma reforma na Constituição, pela qual teria apenas dois artigos: “Artigo 1º – Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. Artigo 2º – Revogam-se as disposições em contrário.”

    É disto que se deve falar, quando eclode mais um escândalo para regozijo de aproveitadores, demagogos e da mídia cujos interesses vêm desde o Império, já que no Brasil Colônia a Coroa não instruía o povo daqui, a exemplo da Metrópole, que continua o quintal da Europa. Este é o país do jeitinho, do sabe com quem está falando, do desapego à gente, ao território, à fauna, flora e à língua que poucos dominam e ainda tem gente que ache difícil

    Os ladrões e arrombadores de colarinho branco, camisa azul e sapatênis continuarão a saquear a gente e o país seja em Brasília, seja em que canto for, afinal, têm dinheiro, network e poder. Justiça, é utopia. Ninguém confia e ainda dúvida de sua eficácia. O Império da Lei, ora, nem espelhando aquela nação do norte da américa que ruma em direção à breca como nunca dantes visto. Sou espirituoso, ainda não é o fim!!!

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