Selic de até 23%. Topa?, por Antonio Machado

Novo IOF sobre o crédito equivale à Selic já obesa saltar para 18% a 23%. Não vai funcionar

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

BRASIL S/A

Selic de até 23%. Topa?

Por Antonio Machado

Para ganharmos tempo e evitar enrolação, vamos aos fatos. Sabe o Imposto sobre Operações Financeiras, IOF, aumentado no último dia 22 sem aviso prévio nem avaliação sobre as suas graves sequelas?

Pois é: a tungada do novo IOF nas operações de capital de giro, desconto de duplicatas e recebíveis equivale a um aumento da Selic dos atuais 14,75% ao ano, por si já um disparate, para 17,95% (em contratos de 30 dias) a 23,07% (com prazo de até 120 dias).

Isso é absurdamente injustificável. Mesmo se a revogação implicar a paralisia do governo por faltar dinheiro, o chamado “shutdown”. A consequência será o “shutdown” da miríade de pequenas e médias empresas, de padarias e confecções a metalúrgicas e lanchonetes.

Tanto o crédito, já caro e seletivo devido à inadimplência, seria ainda mais gravoso para o tomador, quanto os bancos provavelmente arão a escolher a dedo a clientela. O que é mais importante?

Atender os programas eleitoreiros anunciados nas últimas semanas pelo governo, para recuperar a popularidade pensando nas eleições em outubro de 2026, ou a multidão de eleitores remediados cujas contas dependem das milhões de micros, pequenas e médias empresas?

É esse o ime criado pelo Ministério da Fazenda ao anunciar os aumentos das alíquotas do IOF, cuja incidência alcança tudo o que se movimenta com dinheiro – do cartão de crédito e débito a fundos de investimento, apólices de seguro, previdência privada, compra e venda de moedas, até sobre renegociação de dívidas. O indivíduo está sujo no Serasa, quer pagar e, no parcelamento, aparece o IOF, cobrado na frente, como se fosse um pedágio ao governante da vez.

Não procede, portanto, o noticiário dizer que os presidentes da Câmara, Hugo Motta, e Senado, David Alcolumbre, estão submetidos a intensa pressão do empresariado de todos os setores e da banca.

A avaliação do mau o dos condutores da política econômica – da qual o Banco Central nada tem a ver já que a sua diretoria nem foi chamada para participar das discussões -, dispensa pressões.

O tamanho da pancada é tão forte e contraproducente para a saúde da economia e o bem-estar social que só insensíveis e incapazes de calcular os ônus dos juros compostos defendem uma coisa dessas.

O contexto da má decisão

A verdade é que o presidente abriu precocemente a campanha à sua reeleição, o que excluiu o que não desse retorno imediato, como a reforma das políticas e programas, hoje disfuncionais, implicando um crescimento econômico movido a gasto público e a endividamento induzido, especialmente das famílias suscetíveis a tais apelos.

Vale dizer que este sentimento curtoprazista antecede a própria posse, constatado pela aliança oportunista com a parte majoritária do Congresso em fim de mandato para aprovar a PEC da Transição. Ela permitiu R$ 168 bilhões de novos despesas para o então futuro governo, embutindo o apoio tácito para que os chefes do “centrão”, que dominam o Congresso, mantivessem o tal “orçamento secreto”.

A combinação exigia o enterro do “teto de gastos”, criado em 2016 para forçar as transformação da gestão do setor público federal. Ao indexar a expansão da despesa realizada em 2016 só à inflação, o setor público estaria asfixiado em pouco tempo sem a revisão das rubricas da lei orçamentária, sobretudo os gastos obrigatórios com folha de servidores, INSS, saúde, educação e linhas sociais.

Destas, ou apenas uma reforma mitigada da previdência. Ficou acertada na PEC da Transição que o governo proporia uma opção ao Congresso, dado pelo chamado “arcabouço fiscal”, uma regra muito branda (permite, por exemplo, crescer gastos acima da inflação e reserva uma cota obrigatória ao investimento público). Também não deu certo, dada a indisposição de Lula a qualquer ajuste fiscal.

Esperteza demais come o dono

Esta sucessão de diretrizes equivocadas dá o contexto da decisão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de criar arrecadação com o IOF, tributo regulatório usado irregularmente como puxadinho da MF desde a sua extinção em 2007. Por não ter fim arrecadatório, foi o recurso cogitado para não recorrer à aprovação do Congresso.

O orçamento deficitário, apesar da margem de tolerância prevista pela regra fiscal, obriga o Tesouro a emitir mais papéis de dívida além do habitual para substituir os bônus vencidos.

Se a economia cresce graças ao consumo criado por artifícios (energia e bujão de gás gratuitos, Pé de Meia, crédito consignado ampliado etc.), no entanto, bate na inflação, à falta de produção interna, e escorre para importações. É onde entra o BC subindo a taxa Selic.

A ideia é convergir a inflação à meta fixada pelo próprio governo (3% em 12 meses). Isso implica desacelerar o emprego, mas não é o que tem acontecido. Lula quer um “Pibão” com objetivo eleitoral.

Entre tais condicionantes, Haddad apelou a aumentos de impostos, eliminando subsídios e privilégios, até que vacilou com o IOF. O apoio do mercado que usufruía, mas tal como no dito “ruim com ele, pior sem ele”, portanto, apoio só tático, se esvaiu. Criou-se esse imbróglio, com contorno eleitoral, que Lula e ele terão de sanar.

O cansaço dos coadjuvantes

Aos senhores que manejam o poder em Brasília faltou um senso de obviedade: entender que o grupo de centro-direita cansou de ser coadjuvante, embora seja a força eleitoral majoritária no país.

Não fosse Bolsonaro como mala sem alça, o candidato a medir força com Lula já estaria em campo, provavelmente o governador Tarcísio de Freitas (PR-SP) ou Ratinho Jr (PSD-PR). Isso está em formação.

A boa-vontade dos presidentes do Senado e da Câmara com o governo tende a ser mais escassa, apesar do olho gordo do centrão nas prebendas federais. A tradicional omissão do empresariado com a política também deverá mudar.

Tudo somado, o IOF acabou servindo para unir o que estava disperso e enquadrar os adesismos eventuais das chefias do Congresso. As sequelas do IOF, afinal, são graves, tornando-o indefensável, ainda que os políticos percam um naco das emendas no ajuste orçamentário que terá de ser feito.

É para ficar atento: o que não se fará este ano nem em 2026 terá de ser feito em 2027. Será preciso algo mais rápido, intenso e transformador, sintonizado com as enormes mudanças tecnológicas e geopolíticas da década. A fila vai andar. Que assim seja!

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4 Comentários

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  1. Olha, é tanta asneira nesse texto, que quase dá vontade de defender o governo.

    Inflação de demanda? Onde?

    Programa eleitoreiro?

    Uai, em que catzo de planeta um programa não é eleitoreiro?

    Pessoas viram esperando que governos cumpram agenda que converge com as suas demandas?

    Ou não?

    O problema não é o IOF sobre um crédito caro, o problema é o crédito ser a única opção, desde capital de giro até a compra de banana na feira.

    E com a receita preconizada pelo autor, apesar da retórica, o negócio é na base do juros e financeirização…

    O texto parece saído da bancada da Globo News.

    Ou é juro ou arrocho fiscal.

    Povo?

    Consumo?

    Bem estar?

    Para quê?

  2. OK. O presidente Lula está sendo eleitoreiro.Por aumentar o IOF para cobrir o rombo deixado por Paulo Guedes?
    Lendo um artigo recém publicado aqui no GGN: foram mais de 41 bilhões gastos a apenas 3 meses das eleições na PEC dos Benefícios. E o articulista elogia o Congresso? Está brincando, né? Uma PEC é uma emenda constitucional que exige 3/4 do Congresso para ser aprovada. Bom, pode-se a argumentar que não foi este Congresso que aí está. É preciso ir atrás das diferenças…
    Mas há mais do mesmo (quer dizer, do rombo). Nessa tal PEC aí foi uma dinheirama que se jogou aos caminhoneiros, taxistas e bolsistas (1000 reais para aqueles e mais 200 reais para cada um destes).
    E quanto ao petróleo: uma renúncia fiscal de mais de 52 bilhões para enrolar o povo e dizer que os culpados eram os governos estaduais que cobravam muitos impostos.
    E ainda tem mais: o governo anterior (do Bozo) suspendeu o pagamento de 92 bilhões em precatórios, deixando a “bomba” na mão deste governo.
    Diante de tanto rombo estamos de parabéns. Agimos com responsabilidade. Mesmo diante daqueles que lá no exterior avaliam a nossa economia. Estamos à beira de receber a classificação de grau de investimento. Quer mais?
    Irresponsável é quem armou toda essa destruição do país. Irresponsável é quem se omitiu, deixando de votar, branqueando o anulando seu voto em 2018. Irresponsável foram aqueles de declararam estar diante de uma escolha difícil.
    Difícil era: escolher entre um professor criador de muitas políticas públicas premiadas aqui e no exterior e um capitão terrorista, homofóbico, misógino, mentiroso, antidemocrático e, agora também golpista.

    Vai ficar reclamando dos IOFs da vida? Que não seja então para ficar defendendo que para não haver inflação tem que despedir todo mundo. Ora, se estão empregados com carteira assinada estão produzindo, são gente simples que produz muito mais do que recebe. Emprego que gera inflação é o emprego que nada produz. Sabe aqueles assessores itidos sem concurso para fazer rachadinha com deputados e senadores? Aqueles empregos talvez gerem inflação. Os contratados nada produzem.

    E mais: os programas sociais estão aí para compensar a superexploração da mão de obra. Corremos o risco da Crise. Tudo maravilhoso: máquinas maravilhosas produzindo bens super desejáveis. Porém, cadê os consumidores? Os tais contratados com carteira assinada que estão produzindo ainda não se deram conta de que estão produzindo muito mais do que aquilo que recebem. Conformaram-se a ser miseráveis e no lado do mercado não há ninguém que enxergue a necessidade de pagar um salário que realmente esteja mais próximo do valor daquilo que produzem. Ainda bem que o governo pode e faz. Gás e energia elétrica de graça. Vamos rodar a roda do consumo que vai gerar mais produção e mais crescimento.

    1. Realmente, temos um ministro que sabe muito de economia.
      O problema é que o nosso grande estadista e sua esposa não sabem o que é fazer economia.

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