SOFISTICAÇÃO E SIMPLICIDADE

 

 

 

Um dos maiores problemas do Brasil no momento é a infelicidade da classe média. A economia do país está crescendo, o padrão de vida e educação da população melhorou, a taxa de mortandade infantil diminuiu, o país assumiu compromissos internacionais importantes e os está cumprindo de maneira satisfatória, ocorreu um sensível aumento no tráfero aéreo com ganhos evidente para as companhias que operam no setor e para o turismo. Mas nada disto parece fazer a classe média brasileira ficar satisfeita.

 

Alguns analistas fornecem explicações sofisticadas para este fenômeno. Creio que as coisas são bem mais simples. Segundo Tito Lívio, os romanos acreditavam que os seres humanos só tinham dois sentimentos básicos: cobiça e medo. Ambos deveriam ser e eram utilizados pelos cônsules para obrigar os soldados a combater. 

 

A cobiça era um sentimento fácil de manejar. Os soldados romanos eram plebeus e encontravam na atividade militar uma oportunidade de subsistência (mediante o pagamento do salário)  e de enriquecimento (mediante pilhagem). O medo, entretanto, era um sentimento um pouco mais delicado, pois as vezes fazia o soldado refugar o combate. E por isto, os comandantes romanos eram impiedosos e brutais, fazendo o que fosse necessário para impelir os soldados romanos ao combate. Os legionários eram levados a temer mais seus cônsules do que os inimigos mediante a aplicação de penas corporais (surras com varas, estrangulamento no tronco, abandono às feras fora do acampamento fortificado e a execução aleatória de um soldado a cada dez). Vez por outra o comandante mandava alguém ficar na retaguarda para queimar o acampamento e as bagagens para que a tropa que se deslocava para o combate soubesse que não teria para onde voltar e não sobreviveria se não derrotasse o inimigo.

 

Estamos longes daqueles tempos épicos, mas conservamos os mesmos sentimentos básicos que os romanos. Os membros da classe média cobiçam ter o mesmo padrão de vida que a classe alta. A distância que os separa de seu objeto de desejo, entretanto, é muito grande. E por isto eles fixam sua atenção na classe baixa, da qual pretendem se distinguir da única forma que a sociedade do consumo permite (através do consumo). Se o padrão de vida da classe baixa melhora e a distinção pelo consumo já não é possível, o medo pavor  toma conta dos membros da classe média. Afinal, além de não conseguirem se igualar à classe alta eles não podem  mais se distinguir da classe baixa. A igualdade os atordoa e por isto é preciso estocá-los.

 

A única forma de lidar com estas pessoas é fazê-las desejar mais e sentir mais medo. Um estímulo à sofisticação de alguns produtos e ao mercado de luxo faria os membros da classe média gastarem  mais, sentindo-se mais felizes em razão de consumirem produtos exclusivos (que proporcionem a distinção que eles desejam).  Mas isto não basta. É preciso fazer o medo deles sempre crescer mais. Quanto maior for o medo que eles tiverem de cair para a nova classe baixa (ex-classe miserável), mais eles ficarão conformados ao seu atual padrão de consumo e à melhora da situação de vida da população em geral.  

 

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