Aldo Fornazieri
Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política.

O governo, os erros e a prudência, por Aldo Fornazieri

O governo não tem comando político – algo que dizemos há meses – agora é algo percebido a olho nu por quem olha da planície para o Planalto.

Maquiavel, por Lorenzo Bartolini

O governo, os erros e a prudência, por Aldo Fornazieri

O governo Lula tornou-se uma fábrica de crises. A oposição nem precisa se esforçar. Os materiais de ataque são fornecidos graciosamente pelo próprio governo. Mesmo com toda a tempestade do julgamento dos antos golpistas, a oposição consegue ficar na ofensiva e causar estragos significativos. Militantes, ativistas e apoiadores do governo chegam a olhar atônitos para Brasília: em que pese bons resultados na economia, não conseguem vislumbrar capacidade de reação política e a indicação de campinhos promissores para o futuro.

A nova crise, a do IOF, caminhou por trilhas já percorridas em crises recentes, particularmente às do anúncio do ajuste fiscal no final de 2024 e a do Pix no inicio deste ano. Sidônio Palmeira não se revelou o mago da comunicação, aquele que domina a arte do bem comunicar para conquistar corações e mentes. Gleisi Hoffmann, “a mulher bonita”, não confirmou a profecia de Lula de que “surpreenderia” na articulação política. Até agora só colheu derrotas.

Que o governo não tem comando político – algo que estamos dizendo há meses – agora é algo percebido a olho nu por quem olha da planície para o Planalto. Tem-se um ministério desorganizado, cheio de intriguinhas na cozinha do Palácio, que começam com Janja e terminam com escaramuças entre os ministros Fernando Haddad e Ruy Costa.

Os relatos que vêm de dentro da istração e dos agentes públicos de outras esferas que se dirigem aos ministérios para tratar de assuntos de municípios e estados, chegam a ser espantosos: revelam um alto grau de desorganização e bateção de cabeças nas estruturas internas e escalões inferiores do governo.

O Partido Democrata e Biden pavimentaram o caminho para que Trump voltasse à Casa Branca. O governo Lula e o PT fazem enorme esforço para perder as eleições em 2026. Note-se que nos Estados Unidos a economia estava em franca recuperação e, no Brasil, com a exceção de alguns pontos, a economia vai bem. Mas o governo é liderado pelos acontecimentos e dominado pelas suas crises e, os parlamentares do PT, são apáticos no Congresso. Perderam a anergia de lutar, de defender o governo, de liderar.

Em final de 2024, o governo anunciou o pacote de ajuste fiscal, mas aquém do que era necessário. O populismo fiscal de setores do governo e do PT impediram que o ajuste fosse mais duro e jogaram o problema para frente. Esses setores nunca entenderam que a saúde fiscal de um Estado é condição para que ele promova boas políticas sociais. Nos desajustes ficais, as camadas menos favorecidas são as que mais sofrem, seja por cortes, seja por surtos inflacionários que trazem juros altos e erosão dos salários.

Não satisfeitos em não fazer aquilo que era preciso ser feito, os populistas impam a ideia bisonha de que se deveria anunciar o pacote fiscal junto com a divulgação do projeto de isenção da tabela do Imposto de Renda para quem ganha até cinco mil reais. Uma coisa anulou a outra em termos de opinião pública. Um desastre de comunicação.

Depois veio a história do Pix. Outro desastre. Na decisão de adotar e medida e na sua comunicação não foram analisadas as possíveis consequências que ela poderia provocar na opinião pública e na oposição. O bolsonarismo e Nicolas Ferreira massacraram o governo fazendo-o recuar quando todo o desgaste já havia sido consumado. Foi a estratégia de maximização de danos.

Na crise do roubo dos aposentados do INSS através dos descontos não autorizados notou-se a mesma estratégia de maximização de danos. O ex-ministro Lupi, que deveria ter sido demitido quando a fraude foi descoberta, permaneceu no cargo até o desgaste atingir o ápice.

Agora veio a crise do IOF. Essa crise foi contratada no final de 2024, quando o governo não fez o que tinha que ter feito em termos de ajuste fiscal. Não cortou privilégios, não cortou gastos, não reduziu subsídios e não adotou uma política de eficiência do gasto público. A conta daquele populismo chegou agora.

O ministério da Fazenda foi empurrado para um beco sem saídas para cumprir as metas fiscais de 2025 e 2026, agravadas pela perda de arrecadação e por decisões perdulárias do Judiciário e do Congresso. O não cumprimento das metas fiscais produz efeitos negativos na dívida pública e gera instabilidade econômica num momento em que se caminha para eleições gerais.

O anúncio do aumento das alíquotas do IOF foi acompanhado por uma sucessão de erros. Tratou-se de um aumento de impostos anunciado intempestivamente, sem que houvesse negociação com o Congresso e nem com os setores econômicos afetados. Era previsível que haveria contestação. Em princípio, aumento de impostos é uma prerrogativa do Congresso.

Essa história é antiga. Em 1215, o monarca João Sem Terra concedeu a Magna Carta limitando o poder do rei, estabelecendo que o aumento de impostos teria que ser aprovada pela Casa dos Nobres. Este princípio evoluiu para o estabelecimento de que qualquer aumento de impostos na Inglaterra teria que ser aprovado pelo Parlamento. O rei Carlos I (1600-1649), buscando implantar o absolutismo, pretendeu, entre outros abusos, aumentar os impostos sem aprovação do Parlamento, desencadeando a guerra civil entre 1642 e 1649, no contexto da revolução inglesa. No final, o rei foi decapitado.

O Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo e está entre os países com pior retorno de benefícios para a população de recursos auferidos pela alta carga tributária, que é regressiva. Esta é a principal causa da desigualdade social. Os governos petistas não agiram para remover essa iniquidade.

Com o IOF, o governo cometeu o mesmo erro do final de 2024: anunciou contingenciamento do orçamento junto com o aumento das alíquotas. As duas medidas se anularam e o efeito foi negativo. Logo depois de anunciar o aumento, o governo foi obrigado a recuar, ao menos em parte. Fraco e desorganizado, o governo está diante de um ultimato do presidente da Câmara, Hugo Motta, que lhe deu um prazo de dez dias para encontrar outra solução ou ver o aumento do IOF derrotado.

Além de não agir com inteligência estratégica, o governo mostra ter esquecido a virtude da prudência. Desde Aristóteles, a prudência, de modo geral, é tida como a virtude prática do bem decidir para bem agir. Ela define a escolha dos meios para atingir os fins, considerando sempre as circunstâncias e as contingências da realidade. Está implicada com o conhecimento, com a ponderação, com a avaliação racional, com o bom senso e com a escolha moral.

Como a decisão prudencial está entrelaçada com as circunstâncias e as contingências, na escolha dos meios para atingir os fins ela requer sempre, também, uma avaliação das consequências das escolhas decisórias e de sua execução. Exige a capacidade de previsão e de antecipação.

O principal atributo de um governo em sua dimensão executiva diz respeito à sua capacidade decisória, pois esta constitui o principal ativo da legitimidade de sua autoridade. Com Maquiavel, a prudência ou a ter duas novas exigências: 1) em política não existe decisão espontânea; 2) ao decidir, o líder precisa ter a certeza de que não revogará sua decisão. Um governo que revoga suas decisões decidiu errado, se tornará um governo fraco e todos pensarão em enganá-lo. O governo Lula aprisionou-se nessa armadilha.

Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política e autor de Liderança e Poder.

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10 Comentários

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  1. Aldo Fornazieri provavelmente não percebeu a ironia ao dizer que “… o governo não tem comando político – algo que estamos dizendo há meses – agora é algo percebido a olho nu por quem olha da planície para o Planalto.” Não governar é um corolário do neoliberalismo. Portanto, Lula deveria estar sendo aplaudido pela Folha de São Paulo, Estadão, Rede Globo, etc… Isso não acontece porque o governo não mergulhou e não precisa mergulhar na orgia de privatizações desejada pelo mercado. Bem, bem, bem… se consegue resistir às privatizações sendo atacado diariamente pela imprensa (e por alguns comentaristas de esquerda também), o governo claramente tem o comando político. Fornazieri é incapaz de ver isso porque ele só consegue ver as miragens que ele continua criando. Toca em frente, Lula. E não perca tempo com o esvaziamento crítico dos criticadores profissionais.

  2. PS: Fornazieri cita Maquiavel, mas confunde “controle político” com o descontrole de uma oposição histérica reduzida à produzir memes na internet. Ele é grande teórico da comicidade política, sem dúvida (o Fornazieri, não o Maquiavel).

  3. Olha, mais uma vez eu tentei.

    Tentei ser paciente, e ouvir (ler) um texto inteiro desse senhor.

    Ia bem, a crítica da imobilidade política do governo ia bem, até que:

    “(…)Em final de 2024, o governo anunciou o pacote de ajuste fiscal, mas aquém do que era necessário. O populismo fiscal de setores do governo e do PT impediram que o ajuste fosse mais duro e jogaram o problema para frente. Esses setores nunca entenderam que a saúde fiscal de um Estado é condição para que ele promova boas políticas sociais. Nos desajustes ficais, as camadas menos favorecidas são as que mais sofrem, seja por cortes, seja por surtos inflacionários que trazem juros altos e erosão dos salários.

    (…)”

    O que é isso, meu Zeus?

    Míriam, minha filha, é você?

    Ou pior, Roberto Campos (avô) é você?

    Como é que um cara que se diz de esquerda, e que reivindica uma posição intelectual pode escrever uma M*RDA dessas????????

    Sinceramente, está explicado.

    O governo, Lula e etc, não afundam só por suas questões intrínsecas, mas principalmente porque é nisso que uma parte da esquerda se transformou…

    Um monte de lixo conceitual, papagaios do pensamento liberal único…

    Santo Zeus.

    Péssima segunda-feira… péssima…

  4. PS:
    E teve mais miriamleitices no texto, do tipo:

    “Maior carga tributária do mundo”.

    Mentira, a nossa é uma das menores do G20, mas é a mais injusta.

    Como é que um troço desses escreve uma coluna em um espaço como esses?

    He eh… não, talvez a culpa não seja do autor…mas do espaço?

    Quem sabe?

  5. O PT se perdeu quando se burocratizou. Deixou de ter trabalhadores na Direção e ou a ter burrocratas. Gleisi e o maior exemplo. E uma das coveiras do PT. So ver a diferença dela e do Lidenbergue na liderança do Partido.

    Se o PT continuar se degladiando internamente nem o Lula vai salvar. Lula , diga-se, que vacila muito quando a questão e dar poder a mulher que não merece. Não por serem mulheres , mas por não serem do ramo da politica.

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    DOS CRIMES CONTRA A ISTRAÇÃO PÚBLICA
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    Art. 350. Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder:
    Pena – detenção, de um mês a um ano.
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    DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO
    CAPÍTULO III
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    Art. 161. Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no topo ou em parte, de coisa imóvel alheia:
    Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa.
    TÍTULO XI
    DOS CRIMES CONTRA A ISTRAÇÃO PÚBLICA
    CAPÍTULO III
    DOS CRIMES CONTRA A ISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
    Art. 344. Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou istrativo, ou em juízo arbitral:
    Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
    TÍTULO XI
    DOS CRIMES CONTRA A ISTRAÇÃO PÚBLICA
    Favorecimento real
    Art. 349. Prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime:
    Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa.
    plano oculto para matar o Homem
    foi a escolha que a mulher fez
    Rápido, rápido.
    “Matar”

  8. A diferença é que qualquer espirro do governo é transformado em escândalo, é o que a janja falou, é Lula indo a Rússia, é IOF… Um dos que tanto gostam de fazer barulho com as atitudes do governo está caladinho sobre um parente ter sido preso com dezenas de bagulho no carro, ele pouco falou e a mídia pouco cobrou, essa é a diferença… aliás, se fizer o levantamento dos parentes dessa escumalha envolvida com transporte de bagulhos não sobra um …

  9. Quando, na agem do século, o PT assumiu uma faceta europeia de partido, social-democrata, e seu líder, Lula, assumiu a persona do conciliador moderado, faltou aos seus dirigentes uma percepção básica: a democracia representativa não tem comando, não tem autonomia, sequer tem propósito próprio. A democracia representativa é comandada por aqueles que financiam as campanhas e agendas dos representantes. O povo dá o voto, pensando estar dando a agenda; os capitalistas dão a agenda direcionando o voto para este e aquele candidato. Isso é verdade para os legislativo estaduais e nacional, e para os executivos, estaduais e central. Não há outro comando senão aquele que é exercido por quem banca esse sistema. Há anos que eu digo que políticos são apenas e tão somente moleques de recado do Binômio Bancos/Corporações (em breve, arei a denominá-lo Binômio Bancos/Big Techs). O outro poder, o judiciário, está sujeito a um sistema de cooptação mais simples e direto, porém mais oculto. O governo não manda. Obedece a quem lhe paga. O PT imaginou que, assumindo uma face democrática, palatável, poderia governar com um programa minimamente voltado às prioridades da população mais pobre; e, por um tempo, pode-se dizer que foi bem sucedido. Mas o verdadeiro comando do “governo” logo percebeu e se aparelhou para enfrentar esse desafio. Do mensalão à lavajato, tudo foi feito para minar essa movimentação tibiamente progressista. O interregno bolsonarista pôs a perder – ao menos em termos de imagem – esse esquema, razão pela qual o bozo está descartado – porque sempre haverá um bufão ou palhaço para armar novamente o circo (com o pão, eles sequer se preocupam), zelensky e milei que o digam. O governo pode ir para as mãos de um ex-sindicalista de resultados, com a estranha mania de ter fé na vida, e gastar dinheiro do orçamento com descamisados; o comando, jamais.

    1. Perfeito.

      Essa estranha mistura de sindicalismo de resultados, eclesial de base e ex militantes de guerrilha, frustrados e abatidos com suas culpas e sequelas da tortura e da clandestinidade deu no PT.

      Por um tempo, a retórica de aspecto moral atraiu a classe média urbana, que confundia distribuição de renda com caridade.

      Com o tempo, a necessidade de se enquadrar ao “jogo eleitoral” com a paradoxal tentativa de incluir pobres (tibiamente e pelo consumo) gerou essa aversão anti petista.

      O líder carismático se lembrou do seu “mercado de reserva”, e rumou para o Nordeste.

      Mas por lá, também, o encanto está acabando.

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